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A morte de Jesus
Por: DOM EURICO DOS SANTOS VELOSO
ARCEBISPO EMÉRITO DE JUIZ DE FORA, MG.
 
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Meditemos intensamente nesta Semana Santa e contemplemos a morte de Jesus e, como o centurião romano, que a tudo assistia, dobremos os joelhos diante do Crucificado e confessemos: “Este homem era verdadeiramente o Filho de Deus.” (Cf. Mc. 15,19; Mt. 27,54, Lc. 23,47).

Que contrate com o judeus que, vitoriosos com a prisão, queriam a sua morte, e morte infamante, porque se dizia Filho de Deus. E como não podiam assim condená-lo, levaram-no a Pilatos sob outra acusação, política, de querer fazer-se rei e opor-se a César. E, porque sem fundamento, diante do governador vociferavam; “Crucifica-o, crucifica-o!” E este, como a se excusar, lavou as mãos. Santo Agostinho, expõe, contudo a sua culpa, que uniu judeus e pagãos na condenação de Cristo. “Se ele é réu porque matou o Senhor, coagido, eles seriam inocentes que o obrigaram a dar-lhe a morte? De modo algum” (Cf. Agost.. sobre o salmo 63 (64), v. 4). E conclui que eles, os judeus, o mataram pela língua, quando clamaram  pela crucificação.

As três horas de  agonia na cruz enceravam e condensavam  toda a missão de Cristo. A crucifixão, não é a toa que fosse considerada morte infamante, a que se condenavam somente a escória da Humanidade. Era o suplício dos escravos, que nenhum direito tinham. Não é verdade que os judeus não tinham o direito de condenar alguém à morte.  Podiam por apedrejamento. Mas isto não destruía a pessoa. Para Cristo, queriam a morte que o infamasse, que o destruísse, a morte dos escravos, a morte de cruz.

Presas as extremidades do corpo pelos cravos nas mãos e nos pés, o corpo pendia e, pelo seu peso, deslocavam-se os ossos e asfixiava o condenado. Realizavam-se as palavras do Salmo 21 (22), 17-18: “Transpassaram minhas mãos e meus pés e contaram todos os meus ossos”.

Depois de uma noite e uma madrugada de interrogatórios e insultos, o Cordeiro que seria imolado, foi submetidos a um processo iníquo. Foi flagelado e escarnecido como previra o profeta Isaias do Servo de Javé: “Apresentei minhas costas aos que me batiam e a minha face aos que me arrancavam a barba. Não escondi o rosto dos que me insultavam e cuspiam.” (Cf. Is. 50,6). Em seus ombros impuseram-lhe uma cruz na qual seria pregado.

E fez-se trevas sobre a terra. A natureza não queria ver este crime, enquanto Ele, fragilizado, agonizava. Colocado entre dois ladrões, “foi contado entre os celerados”, um dos quais, junto com o populacho e com os “grandes” da cidade o insultavam: “Aos outros salvou, salve-se agora a si mesmo, se é o Cristo, o eleito de Deus. Desça agora da cruz se és o Rei de Israel”. Tido por coisa alguma, viu-se despido e nu enquanto a soldadesca  repartia entre as suas vestes e deitavam sorte sobre sua túnica inconsútil .Desabava-se sobre Ele toda a maldade do mundo. Não tinha formosura. Desprezado. O último dos homens.

Todos o abandonaram. Ele, no entanto, orava pelos que o perseguiam; “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem” Ao ladrão penitente, promete o paraíso. E, na sua sede, os homens deram-lhe vinagre. Só, bradou aos céus, que pareciam estar fechados: “Meu Pai, meu Pai, porque me abandonastes?”.

Mas sua alma permanecia firme na esperança. E, quando exauriram-se todas as suas forças, entregou-se confiante ao Pai; “ Em tuas mãos entrego o meu espírito” (Cf. Lc. 23, 48). Ofereceu-se porque Ele mesmo o quis. “Ninguém tem  maior amor que aquele que dá a vida pelos irmãos.”

Na cena do Calvário, encerra-se a velha lei. O sagrado, o inacessível acabou quando, no momento da morte de Jesus, o véu do templo se rasgou. Deus, por seu Filho, recebeu em seu seio a Humanidade santificada  pela fé  no sangue do Cordeiro. Cristo, sumo e eterno sacerdote. Oferecendo-se a si mesmo como vítima, nos obteve uma redenção eterna, santificando todas as coisas. Era a Páscoa definitiva.

A confissão do centurião já vislumbrava a aurora de uma nova vida. A morte fora vencida e a semente da ressurreição germinava.  Como o próprio Cristo anunciou: “O Filho do Homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos e sumos  sacerdotes e pelos escribas, ser morto e ressuscitar ao terceiro dia” (Cf. Mc. 8,31).

Também a nossa confissão diante do Crucificado não tem a desilusão da morte. Sabemos que Cristo ressuscitou e ressuscitará a todos os que nele crêem.  E num ato de  adoração e agradecimento, professemos: “Este homem era verdadeiramente o Filho de Deus.”



 
 
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