“Cantai ao Senhor um canto novo, cantai ao Senhor, ó terra inteira; esplendor, majestade e beleza brilham no seu templo santo”. (cf. Sl. 95, 1.6)
Meus queridos Irmãos,
A liturgia deste terceiro domingo do Tempo Comum está toda centrada na pessoa e na missão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Cristo é apresentado como Aquele que veio para proclamar um tempo novo, marcado pela Libertação (que refletiremos no Evangelho) e pela unidade que nos é brindada pela Primeira Leitura paulina enviada os Coríntios.
Este domingo salienta a pregação inaugural da vida pública do Senhor Jesus. Lucas narra a atividade de Jesus como uma história escrita por um historiador. Lucas é o evangelista considerado homem da crônica, ou seja, o cronista, aquele que hoje poderia ser considerado o colunista social, aquele que relata as coisas dos homens. Lucas, a seu termo, narra o início da pregação inaugural de Jesus, o Senhor. Lucas vai contando as coisas de Jesus do modo em que a gente possa ter presente e voar no túnel do tempo para estar caminhando com Jesus e degustando de sua vida pública, de seu ensinamento, de sua palavra, de seu ministério.
Lucas colecionou os dados a respeito de Jesus lá pelos anos 80 d.C. para mostrar-lhes melhor quem foi e o que fez Jesus de Nazaré. Como todo bom cronista Lucas imagina Jesus iniciando a sua pregação lá na sua terra, em Nazaré, na reunião de sábado da sinagoga. Os adultos podiam comentar a Lei a partir de um texto profético. Jesus abriu o rolo do profeta Isaías, no texto que fala da missão do mensageiro de Deus para instaurar a verdadeira Justiça e a profunda libertação, pelo fim da opressão e com a finalidade da realização de um ano sabático ou jubilar, para a restituição dos bens alienados, em vistas a um novo início de uma sociedade fraterna, como convém ao povo de Deus.
Irmãos e Irmãs,
O Evangelho deste domingo(cf. Lc. 1,1-4;4,14-21) pode ser dividido em duas partes: a primeira é o prólogo de São Lucas em que o Evangelista garante a solidez das fontes da história de Nosso Senhor Jesus Cristo. A segunda parte do Evangelho nos relata a primeira parte da chamada “Perícope de Nazaré”, ou seja, será refletida no domingo próximo. Lucas inicia a vida pública de Jesus com uma pregação em que é evidenciado que Jesus não age como um santo profeta humano, que fala em nome de Deus, mas como alguém que fala como Deus, “com força do Espírito de Deus”.
Lucas diz que Jesus freqüentava a sinagoga aos sábados. Isso demonstra que Jesus era um homem de oração. Junto com a oração Lucas sublinha que Jesus era um homem profundamente MISERICORDIOSO. Jesus é a encarnação da misericórdia divina, já anunciada no trecho de hoje. Lucas, por fim, anuncia em seu Evangelho a UNIVERSALIZAÇAO DA SALVAÇÀO QUE VEM ANUNCIADA POR JESUS. Jesus não veio para os homens do sistema religioso vigente, para os homens de poder, de posses. Ao contrário, Jesus veio para os pobres, para os excluídos, para aqueles que estão à margem da sociedade. A salvação vem para todos, para todos que aderem ao projeto de vida de Jesus Cristo.
Lucas fala da genealogia e da vida de Jesus: ele ressalta que Jesus tem família, um emprego, amigos, ressalta a geografia, a cultura, a sociedade e de então, e como não poderia deixar de ser, fala da vida dos homens de oração do tempo de Jesus e da própria vida de fé do Senhor.
Meus queridos Irmãos,
Lucas demonstra que desde o seu Batismo Jesus é o homem repleto do Espírito Santo de Deus: “O Espírito Santo descerá sobre ti e a força do Altíssimo te cobrirá com sua sombra”(cf. Lc 1,35).
Jesus inicia a sua vida pública com a fala do v. 18: “O Espírito do Senhor está sobre mim”(v. 18). Lucas sublinha o início da pregação com a ação do Espírito Santo. A salvação trazida por Jesus se mostra como poderosa força do Espírito Santo, que opera nele. A mesma coisa dirá os Atos: “Deus ungiu Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com seu poder, e ele andou fazendo o bem e curando todos os oprimidos pelo diabo, porque Deus estava com ele”(cf. At 10,38).
O Evangelho anuncia os preferidos de Jesus: os pobres, os presos e os cegos. Cabe uma reflexão pessoal: será que nós nos preocupamos com os pobres, com os presos e com os cegos? Será que nós nos preocupamos com os que estão à margem da sociedade. Pobres e excluídos no sentido material, mas, sobretudo, no sentido espiritual, na carência de Deus e da sua fé salvadora. Os presos não somente dos cadeiões, mas os presos aos bens do mundo, a alienação do poder, do ter, do ser, do estar, do fazer, do humilhar. Os cegos da auto-suficiência, da arrogância, da ganância, da falta de fé.
A libertação cantada e encantada pela pena literária de Isaías é realizada por Jesus, o Redentor do Gênero Humano. Por isso Lucas solenizou o poder e o gesto do início da vida pública de Jesus: enrolou o livro, devolveu-o ao assistente e sentou-se.(cf. Lc 1,20). Agora já não seria mais o livro a dizer as coisas, mas ele, Jesus, o novo Mestre, e o faz como mestre, sentado, isto é, com toda a autoridade, porque não falava apenas com a força profética, mas com a força do “Espírito do Senhor que estava com ele”.
Meus caros irmãos,
A Primeira Leitura(cf. Neemias 8,2-6.8-10) fornece um pouco de cultura bíblica, necessária para imaginar os costumes e sentimentos do judaísmo pós-exílico referentes à leitura da Lei. O episódio é praticamente o protótipo do culto sinagogal e a figura central, Esdras, pode ser considerado como o “pai do judaísmo”(antes do Exílio não se pode falar em judaísmo, no sentido estrito; é só depois do Exílio que o “povo de Deus” se identifica praticamente com a tribo de Judá, única que ficou mais ou menos intacta e livre de contaminação.
Uma mensagem própria traz a Segunda Leitura(cf. 1 Coríntios 12,12-30): a alegoria do corpo e dos membros. É uma alegoria que Paulo aprendeu na escola: pertence plenamente à cultura romana e devia ser conhecida por todos os homens cultos da sociedade helenística. Seja como for, Paulo a aplica à Igreja: nenhum membro do corpo pode dizer a outro que não precisa dele. E, com um sadio naturalismo (que desaparece quando se segue a versão abreviada da leitura), fala também dos membros mais frágeis, que são circundados com cuidados maiores – alusão aos capítulos iniciais da Primeira Carta aos Coríntios, onde Paulo critica os partidarismos e ambições que dividem a Igreja de Corinto, lembrando que Deus escolheu o que é fraco e pequeno neste mundo.
Irmãos e Irmãs,
Jesus veio para salvar a alma e o corpo, ou seja, toda a pessoa humana. Ainda hoje a Palavra de Deus gera a Igreja, o Corpo de Cristo. Esta palavra transforma-se em dons diversos, conforme o carisma de cada um para a edificação do Corpo de Cristo que a segunda Leitura nos ensina. Em cada Missa dominical realiza-se o que aconteceu na sinagoga de Nazaré. É Deus que faz a proposta. Estabelece-se o confronto com a Palavra, facilitada pela homilia. E deve seguir-se uma resposta de conversão, de louvor, de ação de graças e de sacrifício.
Nós, o povo de Deus caminhante, a Igreja de Cristo, recriada por Sua Palavra, há de transformar-se em boa-nova de libertação para os pobres e os oprimidos. A Palavra terá como fruto uma evangélica opção preferencial pelos pobres e pelos oprimidos. Despertará e animará o carisma próprio de cada cristão a serviço do bem da nossa comunidade de fiel, tudo com o auxílio e a graça santificante do Espírito de Deus.
Muitos são os dons, inumeráveis são os carismas de nossa fé: tudo na unidade em Cristo para que com Ele uma só Igreja, caminho ordinário de salvação. Assim seja!
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