Liturgia Dominical
 
5º Domingo da Quaresma - C
 
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“A mim, ó Deus, fazei justiça, defendei a minha causa contra a gente sem piedade; do homem perverso e traidor libertai-me, porque sois, ó Deus, o meu socorro”. (cf. Sl 42,1s).

Meus prezados Irmãos,

Chegamos na última semana da Quaresma. Caminhamos nestas cinco semanas volvendo nossos olhares e nossos corações para o apelo do Senhor que nos pede a conversão, o jejum e a esmola como aprimoramento de nosso seguimento de Jesus Cristo, o Redentor.

Domingo passado presenciamos a volta do filho pródigo e a sua acolhida pelo Pai Misericordioso. Hoje, por conseguinte, aparece com mais força ainda o quanto Deus está acima do pecado. Eis a base que se chama “conversão”. Mas, quando se fala em conversão, os céticos objetam: “que adianta querer ser melhor do que sou?” E, ainda, os acomodados: “Melhorar a sociedade, para quê?”.

Nas três leituras de hoje, encontramos a libertação perpassando toda a reflexão dominical. “Não mais penseis nas coisas anteriores, não mais olheis o passado. Eis que faço nova todas as coisas; já está brotando. Não o enxergais?” (cf. Is 43, 18). Na visão do profeta acontecem um novo paraíso e um novo êxodo ao mesmo tempo, um caminho no deserto e os animais cantando o louvor de Deus: Israel volta do Exílio (cf. Is 43,19-20). O povo proclama o que Deus fez(cf. Is 43, 20): “Quando o Senhor reconduziu os exilados de Sião, parecia um sonho”(cf. Sl 126).

“Eu esqueço o que fica atrás de mim e me estico para acatar o que tenho diante de mim”(cf. Fl 3,13): reflexão de Paulo, sempre mais próximo da morte – porque ao escrever esta Epístola está no cárcere – e de seu porto desejado. Pois diante dele está Cristo, que o salvou. Atrás dele fica uma vida de fariseu, que ele considera como esterco, porque o afastou da verdadeira justificação em Cristo Jesus. De fato, enquanto era fariseu, Paulo pretendia justificar-se a si mesmo pelas obras da Lei. Só depois que Cristo o “alcançou”, descobriu que a justiça vem de Deus, que, em Cristo, concede sua graça aos que crêem. Para São Paulo conversão é bem outra coisa que voltar a viver decentemente – o bom propósito da Quaresma! É, por conseguinte, deixar Deus estabelecer em sua vida uma nova escala de valores, tendo por centro um crucificado.

Queridos Irmãos,

Neste domingo(cf. Jo 8,1-11) seguimos firmes na nossa reflexão sobre o tema da misericórdia divina. A misericórdia de Deus encontra seu ponto alto logo mais na crucificação e ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, ou seja, no mistério da paixão. Jesus acentua a paternidade divina. Deus nos ama com amor de Pai. E faz dessa revelação do rosto misericordioso do Pai um dos principais temas de sua pregação. Jesus sempre foi misericordioso em suas palavras, em suas atitudes e em sua vida toda. E pediu isso de seus discípulos; que fossem profundamente misericordiosos e complacentes. A misericórdia de Jesus é infinita, ou seja, é igual à misericórdia do Pai que é profunda e absoluta.

Observamos que o Evangelho de hoje fala da mulher adúltera que nos remete a Dn 13: “os anciãos” querem julgar a virtude de uma mulher, enquanto eles mesmos estão cheios de pecado. Porém, a mulher de Dn 13 era justa. A mulher do Evangelho de hoje, João 8, não era uma mulher justa. Deus não só proteger os justos, mas salva também os pecadores, abrindo-lhes o caminho, para que não voltem a pecar. O contraste, nesta cena, é entre a farsa da “justiça” dos anciãos e a misericórdia de Deus que não condenou a adultera mas pediu que ela seguisse o seu caminho e “não pecasse mais”.

O mandamento maior da salvação é o mandamento do amor. Amar a Deus sob todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Assim a misericórdia nos leva a seguir Jesus de perto e a imitá-lo, porque “Bem-Aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia”(cf. Mt 5,7).

Jesus ensinava com misericórdia e firmeza. Na última semana antes da Paixão Jesus passou as noites no Monte das Oliveiras e os dias no átrio do templo. Jesus ensinava no átrio do Templo. Era de manhã, a hora em que muitos iam ao templo fazer o que hoje chamaríamos da Oração da Manhã. Pouco adiante, o Evangelista diz que ele ensinava com “autoridade”.

Um dia antes, entretanto, os fariseus haviam mandado os guardas do templo prender Jesus, mas os guardas tiveram medo da reação do povo. Deve ter havido grande discussão entre os escribas e os fariseus. Nicodemos tomou a defesa de Jesus, achando que não se podia prender ninguém sem antes ouvir a sua doutrina e conhecer o que esta pessoa fazia. E no episódio de hoje os fariseus tentaram confundir a Jesus com o episódio da mulher pega em adultério. A lei determinava que a mulher deveria ser morta. Mas, se Jesus consentisse na morte por apedrejamento, teria problemas com os romanos, que haviam proibido aos judeus de aplicar, baseado em leis religiosas, a pena capital de Lv.  20,10. Se Jesus mandasse ficar livre, quebraria, à vista de todos, a Lei de Moisés e isso seria suficiente para montar-lhe um processo.

Mas o Messias, o Salvador, agiu com a unção daqueles que são enviados por Deus: Jesus viera trazer não a condenação, mas a misericórdia; não o perdão jurídico, mas o perdão da consciência; não viera para destruir, mas trazer a vida e a vida plena.  Os fariseus e os escribas assemelham-se hoje ao filho mais velho da parábola do filho pródigo. Jesus assemelha-se ao pai misericordioso, que recebe de volta aquele que estava morto e voltou a viver, está nas trevas e viu a luz. Os legalistas queriam aplicar a lei pela lei. Jesus ao contrário veio dar uma nova teleologia para a lei: que é a misericórdia, que encontra em Deus a acolhida e o perdão.

Antes de castigar ou de oprimir as pessoas temos que ter consciência de que somos pecadores. Temos que ter a atitude misericordiosa do Pai misericordioso, rezando e acolhendo com carinho e humildade.

Jesus acolheu a prostituta. Não aprovou a sua atitude de pecadora pública. Mas a acolheu com misericórdia. Apenas não a condenou, porque sua misericórdia era maior que o pecado dela. Observe-se que, de imediato, Jesus acrescenta: “Eu sou a luz do mundo!”

Meus irmãos,

Na primeira Leitura(cf. Is. 43,16-21) nos é apresentado que Deus realizará uma nova salvação. Deus não obrou só no passado diz o profeta. Como antigamente ele abriu um caminho para o povo que voltava do Egito, assim também abrirá um caminho para os exilados voltarem da Babilônia. Fará um novo início; esqueçam o passado. Até a natureza se colocará a serviço da nova obra de Deus, e o povo o transmitirá às gerações futuras.

Na segunda Leitura(cf. Fl 3,8-14) somos convidados a nos convertermos e deixarmos levar pela força de Cristo. Na sua conversão, São Paulo abandonou muita coisa, sobretudo a pretensão de se justificar a si mesmo(pelas obras da Lei) E que recebeu São Paulo em troca? O conhecimento, a experiência do Cristo crucificado e ressuscitado. Mesmo assim, sabe que ainda não alcançou a meta. Importa ser constantemente arrebatado pela força de Cristo.

Meus irmãos,

Deus não é limitado que fique imobilizado por nosso pecado. Ele passa por cima, escreve-o na areia, como Jesus, no episódio da mulher adultera. A magninimidade de Deus, que se manifesta em Jesus, está em forte contraste com a mesquinhez dos justiceiros que queriam apedrejar a mulher. Estes, sim, estavam presos no seu pecado: por isso, nenhum deles ousou jogar a primeira pedra. Decerto, importa combater o pecado; mas é preciso estar com Deus para salvar o pecador.

A justiça considera uma pessoa pelo seu passado, ao passo que o amor a considera pelo seu futuro. E manifestava sua admiração por esta atitude entre os cristãos.

A mera justiça fecha as possibilidades da pessoa, ao passo que o amor, a misericórdia, lhe abrem novos horizontes, a fazer reviver. É isso que Deus faz com toda a humanidade. Não quero a morte do pecador mais sim que ele se converta e viva. O gesto de Jesus passar por cima do pecado da adúltera aconteceu com todos os cristãos pelo batismo e se renova tantas vezes, quando dele obtemos o perdão dos pecados.

Aceite, meu caro irmão, um convite que façamos na semana derradeira bastante jejum, penitência e esmola para entrarmos radiosos na semana da Paixão, morte e ressurreição. Amém!



 
 

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