“Senhor, se levardes em conta as nossas faltas, quem poderá subsistir? Mas em vós encontra-se o perdão, Deus de Israel”(Cf. Sl 129,3s).
Meus queridos Irmãos,
Quando nós recebemos um elogio a nossa reação deve ser de um pronto agradecimento. E, assim, por conseguinte, não seria diferente para com a graça de Deus quando nós somos convidados a agradecer a sua misericórdia para conosco.
A história de Eliseu e Naamã, tema da primeira leitura deste domingo(cf. 2Rs 5,14-17), mereceria mais carinho do que a liturgia lhe consagra. De fato, o recorte litúrgico exige pelo menos uma pequena introdução narrativa, para pôr os ouvintes a par do que precedeu à entrada de Naamã nas águas do Jordão: como este estrangeiro criou a idéia de consultar um profeta de Israel e, sobretudo, como ele queria montar o espetáculo, levando ricos presentes (cf 2 Rs 5,5). Queria que Eliseu o curasse por sua palavra, mas Eliseu o mandou banhar-se no Jordão. O general, apertado, aprendeu a obedecer. Veio a hora de agradecer: novamente, Naamã oferece um presente digno de um príncipe. Eliseu, por sua vez, recusa, pois quem agiu foi o Senhor Deus! Então vem o comovente fim da história: curado, não só de sua lepra, mas de seu orgulho militar, Naamã pede para levar à Síria um pouco de terra de Israel, para adorar, na Síria, o Deus de Israel no seu próprio chão. Além disso, pede antecipadamente perdão porque, como funcionário real, terá que adorar de vez em quando o deus sírio Remon; e Eliseu responde: “Pode fazer tranqüilamente”.
De tudo isso podemos depreender de que a gratuidade do agir de Deus; nem presentes, nem ordens o movem, mas a ingênua confiança que se esconde por trás das manias militarescas de Naamã. A humildade do profeta, que só quer que Deus apareça. A comovente gratidão do sírio. A abertura de espírito do profeta quanto às obrigações religiosas do sírio. O fato de Naamã ser estrangeiro: Deus, assim, “não tinha obrigação com ele”. Mas a nossa fé é uma fé gratuita, generosa e misericordiosa.
Irmãos e Irmãs,
Somos chamados a viver em contínuo agradecimento. A nossa fé tem que ser sempre agradecida. A gratidão, embora todos a queiram, poucos a manifestam com sinceridade. Talvez na mesma proporção dos dez leprosos curados: um só voltou para agradecer. A gratidão é um ornamento da humildade. O orgulhoso não conhece a gratidão.
Somos servidores de Deus e como servidores devemos ser gratuitos e misericordiosos. Toda a história da salvação, descrita pelas Sagradas Escrituras, é a história dos benefícios contínuos e gratuitos de Deus ao povo seu que peregrina neste mundo. Devemos estar em atitude de ação de graças, lembrando as palavras do sábio Sirácida: “Eu te agradeço, Senhor e Rei, e te louvo, porque és o meu Deus salvador! Rendo graças a teu nome... que me livrou da perdição e me serviu de sustentáculo no meio da falsidade”(cf. Eclo 51,1-2).
Jesus sempre rezou agradecendo a Deus as maravilhas que operava pela sua missão, pela ressurreição de Lázaro, por exemplo. E neste sentido São Paulo nos deu vários exemplos, em seus escritos aos coríntios, aos colossenses e aos efésios.
Meus queridos amigos,
Todos nós sabemos que na Bíblia a Lepra era uma doença muito comum no oriente. Leproso era etimologicamente aquele que foi ferido por Deus. A lepra era olhada como castigo de Deus e a pessoa adoentada era considerada uma pessoa pecadora. Aos leprosos eram proibidos o acesso ao templo ou a sinagoga. Os leprosos não podiam freqüentar a praça pública e não podiam viver dentro da urbe. Assim os dez leprosos foram atrás de Jesus fora da cidade. Sendo impuro o leproso não podia se aproximar de ninguém, porque era pecador.
O Evangelho deste Domingo nos apresenta dez leprosos(cf. Lc 17,11-19). Dez eram os leprosos: o número da totalidade, quando nos lembramos que 10 eram os apóstolos e dez são os apóstolos. Os dez leprosos vieram pedir a ajuda de Jesus e chamam Jesus reconhecendo-o como Mestre. Assim todos são convidados a salvação. Da mesma forma a conversão e a mudança de vida para uma inserção na vida comunitária e pastoral.
Na grande comunidade, como na companhia dos dez leprosos, todos somos chamados a sermos filhos e filhas de Deus. Dez foram os curados, mas somente um voltou para agradecer. Assim acontece no dia a dia com as pessoas que quase sempre nunca agradecem. Poucos são os agradecidos que louvam a misericórdia de Deus.
Jesus curou os dez leprosos e mandou que eles se apresentassem ao sacerdote para declarar a cura da lepra efetuada por Jesus. O samaritano voltou para agradecer antes porque não tinha que submeter ao ritual da cura. Isso demonstra que Jesus nos pede que superemos o ritualismo e vivamos uma fé libertadora e inovadora que seja baseada na fé em Jesus de Nazaré e em sua palavra salvadora.
Os leprosos tiveram fé e pediram misericórdia pelo seu estado. Esta deve ser a nossa atitude: fé filial e pedido de ajuda de Deus para superar nossas limitações. Gratuidade do agir de Deus, gratidão por tudo o que Deus faz: tudo é graça. Estes seriam os temas da reflexão de hoje.
Caros irmãos,
Na segunda leitura(cf. 2Tm 2,8-13), o testamento de Paulo chega ao mais alto grau de condensação: Paulo confia a seu cooperador, Timóteo, “seu evangelho”, o anúncio da ressurreição de Cristo, que garante também nossa ressurreição, se ficarmos firmes na fé nesta palavra. As últimas frases formam um hino (cf. 2 Tm 2,11-13). A palavra que é a verdadeira nos ensina: se morrermos com Cristo, viveremos; se formos firmes, reinaremos com Ele; se o renegarmos, Ele nos renegará; e agora vem uma quebra surpreendente nos paralelismos – se formos infiéis, ele será...fiel! Pois não pode negar seu próprio ser.
Irmãos caríssimos,
Quando as relações pessoais se baseiam unicamente na utilidade e no prazer é muito difícil abrir-se à contemplação do amor gratuito de Deus. A mentalidade utilitarista e egocêntrica desvirtua os atos religiosos. Se tivermos perdido o senso de generosidade, de gratuidade, se só agimos movidos pela esperança de algo ou pelo direito à recompensa, muito provavelmente não poderemos ter a experiência da Eucaristia em nossa vida.
Por isso a missa deste domingo nos ensina a descobrir o sentido do receber para abrir-se ao agradecimento.
A Santa Missa, sacramento base e centro de nossa fé, é em primeiro lugar ação de graças sem outra utilidade, sem outro fim senão ela mesma; é a alegria que brota da contemplação do Deus que é grande no amor, que nasce da descoberta de sermos salvos com gratuidade, sem nada querer em troca.
De segunda-feira a sábado os cristãos deveriam recordar os benefícios, as bênçãos de Deus em nosso favor. Assim a nossa oração na missa de domingo ficaria recheada dos benefícios de Deus, manifestados em Jesus Cristo e na vida da Santa Igreja. Importa recolhê-los e apresentá-los a Deus por Cristo, com Cristo e em Cristo.
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